segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Fundação literária do cão

Argos foi o nome de um gigante de cem olhos e de uma cidade grega há quatro mil anos.

Também se chamava Argos o único que reconheceu Odisseu, quando chegou, disfarçado, a Ítaca.

Homero nos contou que Odisseu regressou, ao final de muita guerra e muito mar, e se aproximou de sua casa fazendo-se passar por um mendigo enfermiço e andrajoso.

Ninguém se deu conta de que ele era ele.

Ninguém, salvo um amigo que não sabia mais latir, nem podia caminhar, nem sequer se mover. Argos jazia, às portas de um galpão, abandonado, crivado pelos carrapatos, esperando a morte.

Quando viu, ou talvez farejou, que aquele mendigo se aproximava, levantou a cabeça e abanou o rabo.

(Eduardo Galeano,
Espejos. Una historia casi universal foi lançado em abril, simultaneamente na Argentina, Espanha e México.)

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